A Boa Nova: Uma Igreja Medieval no Pará do século XIX – O projeto teológico-doutrinário do bispo Dom Macedo por intermédio do neomedievalismo

The Good News: A Medieval Church in 19th century Pará - Bishop Macedo’s theological-doctrinal project through neo-medievalism

Mayara Fernanda SILVA DOS SANTOS1
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ, Brasil.
https://orcid.org/0009-0007-3087-7996

Resumo: No Pará do Brasil, na segunda metade do século XIX, o bispo diocesano Dom Antônio de Macedo Costa empreende uma grande obra física, iconográfica e teológico-doutrinária na Catedral da Sé de Belém e em seu bispado. O que parece ser uma simples reforma se revela numa busca por (re)construir uma Igreja Medieval. Por meio do jornal diocesano A Boa Nova (1871-1833) e outras publicações de sua autoria ou direção, observaremos como o bispo Dom Macedo forja um projeto teológico-doutrinário medievalizante para o bispado do Pará. Analisando o seu discurso, por intermédio do neomedievalismo, podemos observar que ele se opõe à modernidade do século XIX e busca se alinhar à Idade Média, tendo-a como fonte de legitimidade, identidade e auctoritas. As apropriações que Dom Macedo faz do medievo o levam na direção de (re)criar teológica e doutrinariamente uma Igreja Medieval no Pará.

Palavras-chave: Dom Antônio de Macedo Costa; Neomedievalismo; Teologia; Igreja Medieval.

Abstract: In Pará of Brazil, the diocesan bishop Dom Antônio de Macedo Costa carried out extensive structural, iconographic and theological-doctrinal work on the cathedral of the Sé of Belém and in his diocese in the second half of the 19th century. What looked like a simple renovation turned out to be an attempt to (re)build a mediaeval church. Through the diocesan newspaper A Boa Nova (1871-1833) and other publications written or directed by him, we will observe how Bishop Dom Macedo forged a theological-doctrinal project for the diocese of Pará. Analysing his speech through neo-medievalism, we can see that he resists the modernity of the 19th century and tries to orientate himself towards the Middle Ages, using it as a source of legitimacy, identity and auctoritas. Dom Macedo’s appropriation of the Middle Ages leads him in the direction of (re)creating a mediaeval church in Pará, both theologically and doctrinally.

Keywords: Dom Antônio de Macedo Costa; Neomedievalism; Theology; Medieval Church.

Recibido: 12/03/2024

Aceptado: 02/04/2024

Cómo citar: Silva dos Santos M. F. (2024). A Boa Nova: Uma Igreja Medieval no Pará do século XIX – O projeto teológico-doutrinário do bispo Dom Macedo por intermédio do neomedievalismos. Neomedieval, 1, 57-92. https://doi.org/10.33732/nmv.1.30

Copyright: El/La Autor/a.

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Introdução

A história da Igreja Catedral da Sé de Belém do Pará é atravessada pela atuação do seu décimo bispo, Dom Antônio de Macedo Costa (1831-1891). Este empreendeu uma grandiosa reforma física interna na Igreja, cuja ação é louvada ainda hoje pelos fiéis desta sede, a exemplo da comemoração em 2020 dos 190 anos de seu nascimento. Para além de todo remodelar artístico e ornamental da Igreja, é possível perceber por meio dos jornais diocesanos sob sua liderança, em especial o que nos dedicaremos neste espaço – A Boa Nova (1871-1883), os seus esforços em desenvolver o que chamamos de projeto teológico-doutrinário. Dom Macedo, que mantém um discurso antimodernizante, defende ideias como a supremacia papal, o progresso pela Igreja, a moralização da família, a luta contra as heresias e o paganismo modernos, a exemplo do protestantismo e da maçonaria. Percebemos em meio a essas falas que a Idade Média é tida em seu projeto como uma fonte de identidade, legitimidade e auctoritas. Voltar ao medievo, imaginado e forjado pelo bispo do século XIX, seria a solução para a Igreja de seu presente.

O bispado de Dom Macedo, lido dentro da ótica do neomedievalismo, nos permite analisar, em seus discursos, as propostas de uma Igreja Medieval. Podemos observar o medievo sendo instrumentalizado no Pará do século XIX, em um país sem Idade Média, que busca no passado europeu suas bases de formação. A insistência de ver a Idade Média europeia como fonte de autoridade e legitimidade revela a manutenção de uma concepção colonial branca, no Brasil Imperial, que infelizmente ainda se encontra presente em nossa prática de historiografia e de ensino. O neomedievalismo é, antes de tudo, uma proposta para romper com abordagens intelectualmente ainda colonizadas, comecemos por ele.

Neomedievalismo e Religião

O campo de estudo do medievalismo no Brasil ainda está em construção, mas já conta com contribuições importantes. Uma dessas, fruto dos debates entre brasileiros e latinos, junto com os trabalhos desenvolvidos pela professora Nádia Altschul, é sem dúvida o uso do termo neomedievalismo. Contudo, pelo emprego em publicações recentes, muitos trabalhos mencionados neste artigo ainda utilizavam o termo medievalismo, entretanto a maior parte dos autores já adotou o neomedievalismo. Assim, destacamos que, embora a reflexão seja feita com o vocábulo medievalismo, é somente por uma questão do nosso próprio tempo, ou seja, um período de adoção de uma nova palavra em detrimento de outra, porém dentro do mesmo sentido. O que se chama de medievalismo nas pesquisas apresentadas pelos professores brasileiros Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli, na verdade poderia ser chamado de neomedievalismo, como os autores já o fazem em trabalhos mais recentes. (Altschul et al. 6-18)

No artigo publicado pela revista Antíteses em 2020, os autores Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli defendem a possibilidade teórica de pensar medievalismo e religião. Em diálogo com o medievalista Richard Utz, Amaral e Bertarelli buscam apresentar saídas a fim de superar as dificuldades de relacionar os dois campos de estudos, em decorrência da problemática da reflexão histórica. O principal problema residiria na temporalização, uma vez que ambos caminhariam em direções diferentes, enquanto que a História estabelecera pra si prioritariamente períodos cronológicos em diacronia, a religião lidaria com o tempo com base na sincronia. (Amaral and Bertarelli 97-125)

Richard Utz, no artigo publicado em 2015, apresenta algumas problemáticas que envolveriam o estudo do medievalismo e religião. Sem negar tal possibilidade de relação, o autor aponta suas dificuldades, sobretudo no que tange à temporalidade, aspecto que será explorado pelos historiadores Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli. Para Utz, a História foi inscrita epistemologicamente, especialmente com o advento da modernidade a partir do século XIX, dentro da perspectiva historicista, e a temporalização se tornou a base para pensar presente e passado.

As cultural and semantic historians have demonstrated, time itself and a consciously temporalizing perspective on all subject matter become lead indicators for the advent of modernity. In fact, since the early nineteenth century temporalization has become the central weapon in the arsenal of historicism, the thought paradigm that not only can dissect and structure the present and past, but also guide all academic study at the modern university toward distinguishable periodicities. (Utz 13-14)

Diante disso, para o autor, a dificuldade de estudos teóricos entre religião e medievalismo, mesmo o último sendo um campo multidisciplinar, residiria na radical diferença de abordagem temporal “proposed by these two ways of conceptualizing the world and the relationship between past and present” (Utz 13). A religião lidaria com o tempo de forma oposta ao medievalismo, uma vez que ela possuiria o caráter sempiterno, ou seja, ela teria como pressuposto estar fora do tempo.

Usando como exemplo a questão da transubstanciação na Eucaristia, sem entrar nos debates teológicos que a envolvem, Utz aponta a duplicidade de tempo que este rito envolve. Se, por um lado, a celebração da Eucaristia é um ato de rememorar o episódio da santa ceia descrita nos evangelhos, por outro, é ao mesmo tempo uma prática que busca unir os fiéis a Cristo, reconstituindo a liturgia e ritos e provocando assim um romper do tempo, ou seja, uma suspensão temporária do tempo humano. É a este ponto que chegaria a característica da sempiternal da religião e, para Utz, o impasse estaria lançado, pois a sempiternalidade seria “a good answer to the question why scholars of medievalism studies find it difficultengage in a critical”. (Utz 15)

Contudo, o autor inicia o último parágrafo do seu texto chamando atenção para o fato de que é necessário que o medievalismo lide com a questão temporal da religião. “To me, this example leaves no doubt that scholars in medievalism studies have an ethical obligation to investigate and historicize religion and theology, at leaves in all its temporal manifestations” (Utz 18-19). O que parece uma fala contraditória de Utz, pelo que vinha sendo exposto até então no texto, é na verdade uma tentativa de solucionar o problema. Os exemplos que o autor usa no parágrafo de encerramento apontam para o que ele chamou de manifestações temporais da religião, como o uso indevido dos recursos da Igreja por bispos, ou mesmo a intervenção papal na Conferência das irmãs católicas acusadas de promoverem a renovação à moda feminista na Igreja. Seria possível, para o autor, somente em questões como essas estabelecer uma relação teórica entre medievalismo e religião (Utz 19). Entretanto, Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli apresentam outra possibilidade para essa relação, fazendo uma crítica à concepção teórica de religião apresentada por Utz.

Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli chamam atenção para o fato de que Utz se baseia na concepção teológica para pensar a religião a qual estaria intrinsecamente ligada. “Although we find Utz’s questions about temporalization pertinent, we think that he misunderstood the dogmatic and theological aspects as being intrinsic to religion” (Amaral and Bertarelli 103). Os autores contrapõem que pensar a religião e sua temporalidade a partir de uma visão teológica é produto de uma reflexão e construção medieval.

It is important to highlight that most of what Utz wrote about temporalization is a medieval reflection. Notably regarding Saint Augustine and Saint Thomas Aquinas, despite the different propositions of these authors about time and History. Both medieval philosophers sought to demonstrate how God, who is in Eternity and not in time, is imprinted in history. (Amaral and Bertarelli 103)

Evocando Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, os autores demonstram que o entendimento da religião tendo uma relação sincrônica com o tempo, como apresentado por Utz, é fruto de um processo de construção histórica da própria religião. Se é uma construção, esse caráter sincrônico não é intrínseco da própria religião. Por outro lado, Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli afirmam que a religião, sendo objeto de estudo das Ciências Humanas, possui uma relação diacrônica com o tempo, mesmo que seja permeada por diferentes temporalidades.

However, we sustain that although there are different forms of temporalization in Christianism, one must not forget that religion is an object of Human Sciences and not an ontological revelation as it is for Theology. Therefore, religion also has a diachronic relationship with time and here resides the answer to Utz’s problem. The synchronous relationship with time alluded by this author is not intrinsic to religion, but rather a social construction, to a large extent medieval, and it is able to engender multi-temporalities through a number of performed rituals and liturgies, as in the case of a mass or in the way the Bible is read. (Amaral and Bertarelli 104)

O problema, para os autores, está na forma como é concebida a questão temporal da religião. Ao se considerar a religião como algo somente atemporal, perde-se a dimensão temporal, que também faz parte da religião. O que se considera como multitemporalidade da religião fora construído socialmente, sendo diferentes camadas de interpretações e apropriações ao longo do tempo. Em contrapartida, os autores argumentam que a própria história do cristianismo se imprime na história temporal com a Encarnação2 (Amaral and Bertarelli 105). Um Deus eterno e imortal assume uma dimensão de passageiro e mortal ao se tornar humano. Os autores identificam aqui um paradoxo na base teológica do cristianismo. De um lado, o Eterno, logo fora do tempo, se coloca no tempo ao se tornar homem; de outro, sua vinda à Terra traz uma promessa do fim do tempo terreno a fim de alcançar uma salvação eterna. “Thus, human temporality blends definitely into the atemporality represented by the eternal God” (Amaral and Bertarelli 105).

A justaposição de diferentes temporalidades que compõem o cristianismo é fruto de uma narrativa. Os cristãos vivem no que podemos chamar de entremeio do finito com o eterno, ou mesmo no ponto de encontro entre eles, encontro promovido pela Encarnação. Duas dimensões distintas que se encontram e produzem sentido na narrativa histórica teológica. Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli, tendo como referência Francisco José Gomes, afirmam que “men live in time and history, waiting for the atemporality, narrating and reinventing the Christian narrative of the Gospels” (Amaral and Bertarelli 106).

Os ritos, as liturgias, as celebrações, para além de recordar e manter vivos na memória a religião, funcionavam como um meio do perecível tocar o Eterno. Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli apresentam um estudo de caso, a celebração da bênção Urbi et Orbi pelo papa Francisco em vinte e sete de março de 2020, no qual buscam refletir sobre a possibilidade teórica de pensar o medievalismo e religião. Os autores salientam nesse estudo que as relíquias, os santos, a liturgia desempenharam na missa o papel de transitus, uma vez que cumpririam também a função3 de elevar o fiel ao divino, atuando na dimensão atemporal.

A noção de transitus foi elaborada e consolidada na teologia medieval. Jean-Claude Schmitt, ao tratar da imagem cristã no medievo, salienta que esta deveria ser denominada de imago, uma vez que representaria o fundamento da antropologia cristã. A narrativa cristã se constrói com base na imagem do divino. Um Deus atemporal que cria um homem temporal à sua imagem e semelhança4. Este homem, por meio do pecado, perde sua semelhança com o divino, que só será recuperada pela Encarnação, o meio pelo qual o Deus eterno, através de uma inflexão temporal, se fez homem no tempo a fim de sacrificar-se e abrir possibilidade de salvação e restituição completa da similitude do homem com Deus. O Juízo Final seria o episódio que colocaria fim ao tempo terreno, bem como separaria aqueles que recuperaram a sua imagem do divino e passariam a viver junto com ele no plano eterno, daqueles que perderam essa semelhança e estariam destinados a viver a eternidade em sofrimento, junto com os demônios.

Diante disso, Schmitt esclarece que a imagem cristã medieval não se reduz à mera representação da realidade do que vemos, mas ela se serve dessa realidade a fim de evocar o invisível. A imago torna presente o que não vemos, ela assume a função de transitus entre a realidade natural e a sobrenatural, elevando assim o homem até Deus (Schmitt 14-15). A imago funcionaria como uma epifania, em que todos os elementos que a compõe participam da criação dessa intermediação entre o humano e o divino, ou mesmo, entre o temporal e o atemporal.

A sociedade medieval era marcada pelo simbolismo. O pensamento simbólico ia além da teologia, invadia a literatura e a arte, fazia parte da própria “utensilagem mental do Ocidente Medieval” (Le Goff 331). Para os gregos, o termo synibolon era representado por um mesmo objeto dividido por duas pessoas, sendo um sinal de reconhecimento, simbolizando um contrato. Ele fazia referência a uma realidade oculta.

No pensamento medieval, ‘cada objeto material era considerado como a figuração de alguma coisa que lhe corresponderia num plano mais elevado, e tornava-se, deste modo, seu símbolo’. O simbolismo era universal, e pensar era uma perpétua descoberta de significações ocultas, uma constante ‘hierofania’. (Le Goff 332)

Le Goff vai dizer que o oculto era plano do sagrado e o pensamento simbólico era produto de uma elaboração dos doutos que se entranhava na mentalidade comum. As relíquias, os ritos sacramentais, as preces eram vistos como portas de entrada para esse mundo elevado. “Tratava-se sempre de encontrar as chaves que abrissem as portas do mundo sagrado, o mundo verdadeiro e eterno, aquele onde se podia encontrar a salvação” (Le Goff 332). A imagem é um meio simbólico de adentrar ao sobrenatural, uma porta de contato com o divino. Nesse sentido, tanto as celebrações quanto as imagens adentram no campo do transitus, a exemplo do que observaram Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli. Símbolos que não só servem à memória, mas funcionam como uma suspensão temporal temporária no rito, um meio pelo qual os efêmeros tocam a eternidade, mesmo que por segundos. Essa conexão entre homem e Deus através do transitus é fruto de uma construção teológica medieval, mas que será acessada e reapropriada ao longo da história cristã, como na bênção Urbi et Orbi do papa Francisco apresentada por Amaral e Bertarelli.

Ao pesquisador do medievalismo que lida com a religião, os autores Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli sinalizam que cabe a este perceber “that in several moments e.g., masses, processions or blessings, the celebrant consciously reaches out for a medieval reflection and updates it in contemporaneous terms” (Amaral and Bertarelli 104). Pensar essas apropriações no presente não quer dizer excluir a dimensão sincrônica da religião. O medievalismo é multidisciplinar, o que significa que ele também pode se aproveitar das reflexões teológicas para formular suas teses. Esse é um ponto de destaque, para os autores, no tocante às recriações do medievo no presente como manifestações não explícitas. A fim de perceber tais recriações é necessário o diálogo com a Teologia, bem como com a Filosofia medieval. Entretanto, os autores chamam atenção para quem for utilizar a teoria do medievalismo em relação à religião, sobretudo para a análise de manifestações não explícitas do medievo no presente, sendo preciso atentar-se para os três pontos destacados abaixo:

a) The peculiar way in which religion deals with time, that is, in a multitemporal and sometimes even atemporal manner; b) the resource of auctoritas as a source of legitimation and identity; c) and finally, the criticism to the disenchantment of the world created by Enlightenment. (Amaral and Bertarelli 105)

Nesse sentido, para os autores, não se pode perder de vista que a religião do cristianismo “is by excellence the field of mirabilia, which is a medieval construct” (Amaral and Bertarelli 105). Como parte da construção cristã medieval, o conceito de auctoritas, segundo os autores, se desenvolveu como um conceito chave dentro da religião e seria uma pedra angular para pensar a relação entre medievalismo e religião. Estabelecendo um diálogo com as pesquisadoras Louise D’Arcens e Clare Monagle, Amaral e Bertarelli entendem que a religião cristã vai configurar sua narrativa histórica, conferindo ao medievo uma fonte não só de autoridade, mas também de legitimidade das ações do presente. Louise D’Arcens e Clare Monagle destacam que

Conventionally, Catholic thought is Always couched within tradition. Thinking self-consciously as a Catholic requires identifying the appropriate form canonical authority (biblical, patristic, scholastic) and making claims within a particular reading of the source. This is why Catholic thought is always medievalist, to some degree, because so much of what the Church is today was bedded down structurally and ideologically in the Middle Age, particularly in relation to core doctrine (such as transubstantiation) and the sacramental regime (such as the mass). This not to say that there has not been significant historical change within the Church, but it is to say as an institution it understands itself with pride of be a medieval institution and seeks out those foundations deliberately. (D’Arcens and Monagle 52)

Quando as autoras chamam atenção à tradição Católica, ressalta-se que é no medievo que se (con)forma a maior parte dos dogmas cristãos; nesse sentido, todo esforço de retorno da Igreja a esses dogmas e sua manutenção são em si medievais. Amaral e Bertarelli endossam:

As we see, the bases of the church, many of which are medieval, allow it to self-consciously define itself as a medieval institution. Therefore, in the case of the Catholic Church and a considerable number of Protestant denominations, the relationship between the use of the medieval past and the present serves as a form of legitimation and identity. However, as a liturgical rite, it has the explicit intention of creating the intersection between the multi-temporalities, whether in the Middle Ages or in Contemporaneity. (Amaral and Bertarelli 107)

A frequente retomada de suas bases não pode ser entendida como uma simples manutenção da tradição, mas um retorno a um período, que podemos dizer, de domínio cristão, no qual a Igreja junto ao aparelho de poder do Império conduziu os modos de vida religiosa, social e política. O poder exercido pela Igreja nesse contexto medieval lhe conferiu autoridade não só sobre os fiéis, mas sobre o social. Nesse sentido, o medievalismo pode ser usado para pensar os movimentos religiosos que buscam na Idade Média as suas fontes de formulação, entendendo-a como fonte de autoridade e legitimidade. O que se coloca é que muitos movimentos buscam recriar as bases de domínio da Igreja na sua contemporaneidade, como havia no medievo. Eles se apropriam da sua própria tradição, atualizando-a em seu presente, mas com desejo de reviver o passado, a exemplo dos esforços de Dom Macedo no Pará do século XIX.

O projeto teológico doutrinário, construído paulatinamente pelo bispo durante sua atuação, pode ser lido dentro da chave do neomedievalismo. Seguindo a proposta teórica apresentada por Clínio Amaral e Maria Eugênia Bertarelli, entendemos que o Dom Antônio de Macedo Costa fez do medievo sua fonte de autoridade e legitimidade. Para isso, lançamos mão sobretudo de um periódico fundado e dirigido pelo bispo durante o seu episcopado na região: A Boa Nova (1871-1883). As publicações da diocese nos ajudam a pensar como o bispo Dom Macedo constrói seu discurso e sua visão teológica que forjam a doutrina colocada em prática no Pará. Ao nos debruçarmos sobre essa fonte, encontramos um projeto enraizado na teologia medieval, mais do que isso, que busca nela as respostas para as práticas do presente. Faz da sociedade medieval o modelo a ser seguido e transporta seus valores e discursos para o século XIX, como se estivesse vivendo o mesmo tempo.

A Boa Nova: um projeto Igreja Medieval no Pará do século XIX

Na primeira década de 1860, já podemos perceber a base teórica de Dom Macedo exposta por meio do primeiro periódico criado e dirigido pelo bispo do Pará A Estrella do Norte (1863-1869). Entretanto, para a presente exposição, nos dedicaremos a década de 1870, por meio do jornal A Boa Nova, fundado por Dom Macedo após o fim da circulação de A Estrella do Norte5. Neste periódico, o projeto de Igreja do bispo do Pará não deixa dúvidas, ao se proclamar católico e colocar em prática ações a fim de tornar o Pará e o Amazonas cristãos, ele o faz tendo em vista a Igreja Medieval. Sua primeira edição foi publicada em 04 de outubro de 1871, sendo a última em 20 de maio de 1883. O lema do jornal estava baseado no livro bíblico de Filipenses “Tudo o que for verdadeiro, honesto, justo santo e amável” (Fp. 4.8). O historiador Aldrin Figueiredo afirma que este jornal “foi um dos mais influentes e combativos jornais da época, recheado pelo discurso conservador da Cúria local, presidida à época por uma grande liderança do clero brasileiro, o bispo D. Macedo Costa” (Figueiredo 249).

Um dos destaques do contexto da publicação do jornal A Boa Nova é o fato desta se dar em meio à prisão de Dom Macedo Costa no episódio conhecido na história brasileira como “Questão Religiosa”. Nesse sentido, pode-se perceber um tom mais combativo neste periódico do que na década anterior. Apresenta um diálogo intenso com os periódicos de orientação liberal e maçônica, como os jornais O Liberal do Pará (1869-1889), O Santo Officio (1870-1889), O Pelicano (1872-1874). Não somente as publicações noticiosas ou doutrinárias, mas as respostas à oposição revelam a base teológica de Dom Macedo no seu entendimento do ser católico.

É certo que o exercício teórico que estamos apresentando é uma construção narrativa, que tem por fim evidenciar, através das publicações e outros escritos do bispo do Pará, seu uso do medievo. Entretanto, não se pode fugir do fato de Dom Macedo ser brasileiro e ter vivido no século XIX6. Primeiro, Dom Macedo, nascido na Bahia e exercendo seu episcopado no Pará e Amazonas, não viveu o que poderíamos chamar de uma experiência medieval, nem mesmo seus antepassados, uma vez que não houve o que chamados de Idade Média no Brasil. Segundo, mesmo que o bispo tenha passado um período estudando na Europa, ele o fez no século XIX, período posterior ao que se chama de Idade Média histórica. O contato que o bispo tinha é com a Igreja do presente e mantinha um diálogo íntimo com ela. Daí muitos autores entenderem as ações de Dom Macedo dentro de um movimento de romanização ou mesmo ultramontano.

Não excluindo a proximidade do discurso de Dom Macedo com o ultramontanismo, buscamos abordar a questão por meio da teoria do neomedievalismo, uma vez que entendemos que não se trata somente de um movimento do século XIX, usando os recursos de seu presente, mas sim um movimento deste século de retorno ao passado7. Uma busca por se apropriar do passado medieval como fonte de autoridade, legitimidade, além do uso de suas bases doutrinárias, modelo moral e familiar, ações combativas, denominação de heresias, símbolos como forma de conceder autoridade à Igreja do presente, sem perder de vista a tentativa de retomar a força e o domínio da Igreja tal como era no medievo, em constantes ameaças e ataques às ideias da modernidade. Cabe ressaltar, que a Idade Média é apropriada a partir de uma construção do século XIX, em meio aos embates teóricos de visão acerca de obscurantismo e romantização cavalheiresca. A Igreja Medieval que aparece na narrativa é dotada de uma religião quase sem contradições, uniforme, homogênea, que sempre vence seus inimigos, garantindo assim que toda a Europa permanecesse cristã. O papa é o centro da Igreja, a verdadeira ponte entre os fiéis e a divindade, o sucessor de Pedro, o representante de Deus, infalível e o único capaz de manter a unidade religiosa e social, ou seja, um mundo de paz. É uma ideia fantasiosa do período, mas que é instrumentalizada para o fim que se espera alcançar com a Igreja do século XIX.

A base teológica do bispo do Pará mantém diálogo com filósofos e teólogos de seu próprio tempo, mas no que diz respeito à base argumentativa de autoridade para a sua defesa de Igreja, ele recorre à Idade Média, combatendo veementemente a visão pejorativa de obscurantismo do período e colocando-a como um momento de luz e base para toda sociedade moderna, mesmo que mantenha uma postura contrária à modernidade. Voltemos ao debate teórico apresentado no início deste artigo, no qual entendemos que o exercício feito pelo bispo do Pará é muito mais que uma simples manutenção de uma tradição, mas um desejo de retomada de uma época em que a autoridade da Igreja, mesmo que questionada, se fazia valer e respeitar junto ao aparelho de poder estatal. O objetivo do bispo era se apropriar de tais valores e implementá-los no Pará, tornar viva novamente a Igreja Medieval, mesmo que o território brasileiro não tenha tido este passado e mesmo que o século fosse o XIX.

A historiadora Patrícia Monnerat, ao apresentar um estudo acerca da Questão Nazarena em sua tese, observa que Dom Macedo acreditava “na existência de um catolicismo sem influências do meio, conservado puro desde o momento de sua criação” (Monnerat 83). Entretanto, o que é possível perceber através dos textos escritos pelo bipo do Pará é que este momento de criação não remete ao que historicamente chama-se cristianismo primitivo, mas sim seu período de institucionalização junto ao Império Romano. O que Dom Macedo defende é um catolicismo romano construído e consolidado no medievo. “Devemos ter um paiz catholico. O catholicismo romano, isto é, o Christianismo completo, com seu complexo de dogmas invariaveis, de preceitos positivos, impostos á consciência em nome de Deus pela auctoridade infallivel da Igreja” (Costa,“A questão religiosa do Brasil” VIII). O Brasil precisava da Igreja, o catolicismo era o único meio pelo qual o país não cairia em ruína. Nas palavras de Dom Macedo,

uma sociedade como a nossa, nova, fluctuante, sem tradições, mal constituída ainda, assente sobre bases que o tempo ainda não cimentou, invadida já e minada de todos os lados por tanta impiedade, tanto materialismo, tanto enervamento sensual – achaques que adoecem civilisações decrepitas, – não pode, perdido o apoio que ainda tem na fé catholica, resistir por muito tempo á dissolução e á ruína. (Costa, “A questão religiosa do Brasil” IX)

Uma terra nova, sem tradições e ainda em formação deveria, para o bispo, importar do passado a tradição para a sua base, encontrando-a na Igreja Medieval. “Portanto para viver, para desenvolver-se, para attingir, como todos desejamos, um alto grau de cultura e assentar-se com honra entre os grandes povos livres e prosperos, precisa o Brazil da Religião catholica em que foi batizado” (Costa, “A questão religiosa do Brasil” IX). Diferente do que se divulgava a respeito do medievo, como a época sem produção de conhecimento, o periódico de 1872 de A Boa Nova apresenta em sua argumentação o fato de que a Igreja não seria contra a ciência e o progresso, já que fora ela a responsável pela sua sobrevivência durante a Idade Média.

O fim dos adversarios nesta acusação tão desleal é apresentar a Igreja como a inimiga das sciencias, quando é certo ser ella quem salvou as sciencias do naufragio total na idade media, e tem continuamente favorecido e protegido o progresso legitimo das mesmas sciencias ainda em nossos dias. (“Manifesto Da Maçonaria No Brasil” 2)

Em 1878, o jornal reitera: “a Igreja se deve a conservação das lettras na idade media, a creação das universidades e d’outras escholas por toda a Europa, o impulso dado á architectura e a todas as artes liberaes” (“Accusações Contra a Igreja” 1). Na visão do bispo, a Igreja Medieval deu à Europa o status de elevação de cultura que ela possuía no século XIX. Assim, afirmar que o catolicismo era o único meio do Brasil atingir um alto grau de cultura era defender uma construção cristã medieval, que deu a estes grandes povos essa posição e, portanto, poderia fazer o mesmo pelo nosso país. Essa era a missão do bispo, “esta é a idéa que queremos realisar, esta é a obra de nossa vida” (Costa, “A Questão Religiosa do Brasil” IX). A construção de uma Igreja forte, atrelada ao Estado que regulasse toda a vida social.

Queremos, pois, que vingue, que vigore, que floresça o Christianismo catholico n’esta nossa cara patria brazileira. Queremol-o collocado, como princípio de vida, bem na gemma de suas instituições sociaes, civis e politicas; queremol-o como sustentaculo ás nossas leis impotentes, á auctoridade publica e domestica desmaiadas e sem prestigio; queremol-o como remedio á descrença que nos mata, ao parasytismo que nos atrophia, ao sensualismo que nos devora, ao desrespeito que nos assoberba; queremol-o como um dique opposto ás paixões revolucionarias que já fremem impacientes, e estarão d’aqui a pouco desencadeiadas, vingando tantas injustiças e tantos desacertos accumulados no passado com outros desacertos e outras injustiças ainda maiores para o futuro.

Queremos o Catholicismo, não um Catholicismo deturpado, de mascarada, religião só composta por exterioridades hypocritas, acompanhada de indecentes saturnaes e de sacrilegios que fazem gemer nossos templos; mas o Catholicismo verdadeiro, como elle é, na plenitude de seus dogmas, de sua disciplina, de sua moral. Quem pode achar mal que o queiramos assim? (Costa, “A Questão Religiosa do Brasil” X, grifos meus)

A base da construção teológica do projeto de Igreja Católica sob o episcopado de Dom Macedo Costa é medieval. Em consonância com o bispo do Pará, o bispo de Mariana, Dom Viçoso, compartilha de perto com esse projeto de Igreja Medieval. Entretanto, Dom Viçoso, sabendo que não é possível trazer de volta o medievo tal como fora, aponta para sua ideia de recriação.

Certamente a questão não é a de ressuscitar a Idade Média: sabese bem, e aqueles que nos opõe esta estúpida apreensão o sabem melhor do que ninguém. Mas o que é útil é ressuscitar os sentimentos de justiça, de admiração e de amor que merecem os grandes homens e os grandes santos que o catolicismo inspirou, além dasgrandes instituições que o catolicismo encheu com seu espírito8. (qtd. in Campos 102)

Contudo, é inegável que sua referência é o período medieval. Germano Campos, ao apresentar seu estudo sobre Dom Viçoso, ressalta que há um ideal que marca e permeia as ideias de Igreja do bispo de Mariana, seria “o desejo da restauração do cristianismo como amálgama e sustentação social, cuja referência era a situação política que se apresentara na Idade Média” (Campos 69-70).

A Idade Média para o movimento ultramontano no Brasil é a referência de ações religiosas e Dom Macedo, que compartilha de perto com as ideias ultramontanas, faz do período medieval a base para a construção de seu projeto de Igreja Católica. Muitos são os elementos que o bispo do Pará desenvolve em sua narrativa ou mesmo em suas ações eclesiásticas, que deixam transparecer o caráter medieval. O bispo defende a construção da moral e da família com base na teologia de Santo Agostinho, assume uma postura tipicamente cruzadista em combate aos infiéis, proclama a supremacia papal e a obediência usando a autoridade do Pontífice no medievo e também sustenta que a Igreja é a única capaz de manter a coesão social tal como no período medieval, combatendo veementemente a ideia de obscurantismo atribuído à época.

O tema da família ganha um livro na exposição de Dom Macedo Costa, O livro da Família, publicado em 1879. O objetivo do bispo com a publicação é oferecer os princípios e regras que constituem as famílias cristãs e, para isso, ele recorre ao que está “estabelecido, fixado e determinado, do modo o mais preciso, pelos ditames da lei natural e evangélica, autenticados no ensino da Igreja” (Costa, “O Livro da Família” 2). Ao defender tais doutrinas acerca da família, Dom Macedo situa-a como herança do período medieval.

Êsses ditames são, essas verdades sólidas, êsses princípios sagrados, de cujo exato conhecimento e fiel observância dependem a boa ordem, a harmonia e a felicidade das famílias, levei em mira incutir nas almas nestes tempos em que doutrinas perversas os atacam, os rejeitam, os vilipendiam como mofenta herança dos séculos de obscurantismo. (Costa, “O Livro da Família” 2)

O bispo combate a ideia da Idade Média como um período de obscurantismo no jornal A Boa Nova, do dia 03 de janeiro de 1872. Ao falar sobre a autoridade papal, ele afirma que se lança ao “ridiculo sobre uma organização com palavras de convenção – obscurantismotrevas da idade media – palavras, que só revelam pedantismo e supina ignorancia” (“São Gregório VII” 2). Assim, o modelo de família, que condensaria todos os princípios sagrados, se encontra no medievo. Para exemplificar como funcionaria a família, o bispo recorre a uma comparação apresentada por Santo Agostinho, da família como uma orquestra.

É a família um concêrto; ora, um concêrto, o belo, o harmonioso, resulta de fazer cada qual bem a sua parte. É a comparação graciosa de S. Agostinho. Notai, diz discretamente o santo Doutor, como num côro de músicos, diversíssimas sortes de instrumentos e vozes tocam e cantam, com variedade de sons agudos, graves, médios; e sem embargo fazem todos juntos maravilhosa consonância. Porquê? Porque cada um executa bem a parte que lhe toca. O baixo não sabe o agudo, nem o agudo desce ao médio, e todos vão de concêrto. Execute cada qual em casa a sua parte; mande quem pode, obedeça quem deve; e logo, diz S. Agostinho, a casa está em harmonia; que não é esta outra cousa mais que a ordenada concórdia do mandar e obedecer. (Costa, “O Livro da Família” 53)

O esforço do bispo com o livro mostra sua relevância, uma vez que ele entendeu que o intuito da modernidade era destruir tais princípios da família. “É bem deplorável fato, e cheio de funestíssimas consequências para o futuro, o esfôrço que se está fazendo para destruir as verdadeiras tradições, o genuíno caráter da família”. O que se observava era “a torrente das novas ideias vai levando tudo de rôjo, envolvendo no sumidouro comum do sensualismo enervante, do brutal egoísmo” (Costa, “O Livro da Família” 2-3). Era necessária uma posição da Igreja, uma vez que a família era o centro de todo o organismo social.

A raiz corrompida, vasa no tronco e nos ramos da árvore o seu fatal veneno. Por igual modo, da família pervertida pelo espírito da impiedade moderna, estão dimanando os males que lamentamos em tôdas as esferas sociais. Se queremos que floresçam os bons costumes, se queremos que esta árvore da pátria dê frutos, não pêcos, mas sazonados, de paz, de ordem, de verdadeira liberdade, de sólidos progressos, de próspera, gloriosa e fecunda civilização, é acudir com o remédio à fonte do mal, é tratar já e já da raiz, que se embeba em bons sucos, achegando-se-lhe terra congruentemente adubada. (Costa, “O Livro da Família” 3)

Diante de tanta destruição causada pelas novas ideias, só restava à Igreja combatê-las. Como tratar da raiz, ou seja, como fazer prevalecer as ideias cristãs da Santa Sé diante de tantas outras possibilidades de vida? Oferecendo “as puras emanações do cristianismo” (Costa, “O Livro da Família” 3), por meio do combate a toda e qualquer ideia contrária, uma verdadeira cruzada contra o paganismo e suas crenças.

A Assembleia Legislativa do Pará, em 17 de abril de 1872, publicou no jornal A Boa Nova uma monção em favor do poder temporal do papa, reconhecendo todos os esforços do bispo Dom Macedo Costa como uma liderança desse movimento. A moção aponta que o “Bispo diocesano prohibiu a leitura dos periodicos anti-catholicos, e com vigor apostolico profligou-lhes os erros, as heresias, as blasphemias, as impiedades” (“Moção Em Favor Do Poder Temporal Do Papa” 1). O movimento católico no Pará de Dom Macedo unia não só a província, mas todo o catolicismo que tinha o papa como chefe supremo.

É bello e sublime o movimento dos catholicos em favor de seus Chefe, unidos na mesma fé, na mesma caridade, na mesma esperança, e animados do mesmo zelo e do mesmo amor fazem achoar nas margens do Tibre votos de sympathia, e sincera dedicação ao throno pontifício, e á causa santa da verdade e da justiça.

Estas vozes, que partem de todos os angulos do mundo, do Danubio e do Sena, do Missipi e Amazonas, será um obstaculo insuperavel aos obreiros das trevas, e dará a Igreja final e decisivo triunpho.

E caberá ao Pará a gloria de ter espontanea e generosamente entrado na santa cruzada contra os que pretendem ressuscitar o paganismo sob todas as suas formas. (“Moção Em Favor Do Poder Temporal Do Papa” 2)

A luta contra os chamados inimigos da Igreja, mesmo que sejam ideias, práticas e movimentos do século XIX, advindos com a modernidade e a reforma protestante, é feita sob a concepção medieval da cruzada. O combate ao presente deveria ser feito com as mesmas armas do passado. Mesmo que Dom Macedo estivesse lidando com problemas de sua época, ele não busca nela suas referências de luta, mas sim no passado medieval da Igreja, ou seja, uma teologia e doutrina medievalizante.

Na mesma monção da Assembleia Legislativa do Pará, declara-se politicamente apoio total ao papa. “O povo da provincia do Pará é catholico, apostolico, romano, reconhece o Papa seu chefe supremo na ordem espiritual, no Bispo seu guia, seu mestre nas cousas da Religião nesta diocese”. Um apoio que ultrapassa os limites espirituais e adentra ao ambiente temporal. “O povo do Pará pensa com o Papa e com o Episcopado que a soberania temporal é necessaria ao chefe da Igreja universal para o pleno exercício de seu poder espiritual” (“Moção Em Favor Do Poder Temporal Do Papa” 1).

As palavras de declaração da Província do Pará enquanto católica apostólica romana e submissa ao papa tem um fundamento teológico na Igreja Medieval. Em 03 de janeiro de 1872, menos de dois meses do início de circulação do jornal A Boa Nova e no mesmo ano do início dos conflitos mais marcantes da chamada “Questão Religiosa”, Dom Macedo abre a publicação com um artigo dedicado ao papa Gregório VII, que dá título ao texto. O pontífice “foi, para muitos cronistas dos séculos XI e XII, o principal perpetuador da saga de ações milagrosas associadas às ações conciliares promovidas pela autoridade papal a partir de Leão IX” (Rust, “Colunas vivas de São Pedro” 69). Gregório VII vai ser construído pela historiografia dos séculos XIX e XX como o grande nome da chamada Reforma Gregoriana9, que se tornará um símbolo de fortalecimento da autoridade papal sob o poder temporal na história da Igreja.

Leandro Duarte Rust explica que a imagem de Gregório VII foi desenhada por muitas mãos ao longo de tempo, mas ganha forma entre 1820 e 1920 (Rust, “Colunas vivas de São Pedro” 22). O historiador identifica em Augustin Fliche e sua obra publicada em 1924, Le Réforme Grégorienne, um momento que em se produz uma síntese sobre o papado medieval de maior referência no século XX.

A perspectiva proposta por Fliche pode ser assim sintetizada: o amplo movimento de reestabelecimento do poder papal ocorrido a partir de 1049 – cujo ‘maior protagonista’ foi o papa Gregório VII (1073-1085) – foi uma ampla resposta às intermináveis ‘desordens’ que se alastraram por toda a Cristandade em razão da ausência de um ‘Estado’ forte. (Rust and Lopes 136)

Rust, apresentando a tese de Fliche, continua dizendo que o autor do século XX esclarece que a decadência do poder carolíngio criou um “vácuo político deixado pela inexistência de uma autoridade imperial ou régio de se fazer obedecer” e deu espaço para emergirem as rivalidades que pôs o século X em uma profunda crise social. Assim, “o estabelecimento de uma cúpula papal comprometida com a ‘reforma’ da ordem social tornou-se o nervo do ‘movimento gregoriano’” (Rust and Lopes 137). Rust conclui o pensamento de Fliche apontando para o que se tornou a síntese de sua argumentação, que foi compartilhada e seguida, quase que sem críticas, pela historiografia do século XX.

Podemos agora fechar o círculo do raciocínio de Fliche: confrontado com o risco geral de dissolução da ordem criada pela ascensão da nobreza, o papado foi forçado a ocupar um lugar de Estado, arrolando para si o controle de certos direitos, atribuições e competências até então exercidos pelos poderes temporais. Uma conclusão desenrola-se nas entrelinhas deste pensamento: a “reforma gregoriana” gerou a ascensão política do papado, ou seja, em seu bojo foi gestado o poder apostólico contra o qual, um dia, protestariam Lutero e Calvino. (Rust and Lopes 139)

A imagem construída de Gregório VII, como o maior papa que dá forma a um grande movimento de reforma na história da Igreja, também passa pela disputa de poder com o rei Henrique IV, conhecida como a Querela das Investiduras. Na publicação do Dictatus Papae, em 1075, o papa Gregório VII expõe 27 proposições que versam sobre a autoridade papal e seus domínios espirituais e temporal, bem como exclui o direito dos leigos de nomear bispos. Diante disso, o rei do Sacro Império Romano Germânico assume uma postura de oposição ao pontífice, considerando-o deposto e articulando uma nova eleição papal. Depois de diferentes episódios, Gregório VII chega a excomungar o monarca, o que ocasiona muitos outros desmembramentos, não sendo nosso intuito aqui abordá-los. A imagem criada do papa, aponta Rust, passa tanto pela sua glorificação, como pela abordagem de sua vilania, uma vez que teria deposto um rei. “As variações, todavia, não alteram o efeito fundamental. Isto é, a conclusão de que a personalidade do papa prevaleceu sobre a época feudal e determinou os rumos da história” (Rust, “Inventando Gregório VII” 23)

Nossa questão remete ao conflito travado por Gregório VII com Henrique IV, uma vez que o jornal dirigido por Dom Macedo, A Boa Nova, traz em sua publicação a imagem do pontífice do século XI e da Idade Média como uma referência de construção religiosa e social para o seu projeto de Igreja no Pará. O bispo do Pará apresenta, em seu jornal, o pontífice como vítima das mentiras modernas e ao mesmo tempo um brilhante papa e amigo da justiça. A imagem que se consolida no século XX, compreendida por Leandro Rust, de Gregório VII como o grande nome da Igreja no século XI, representando um momento de virada com a centralização política e religiosa, já era defendida pelo jornal da Diocese do Pará em 1872. Ressalta-se que não é somente uma disputa argumentativa em defesa do que o papa foi na época medieval, mas a defesa do que o pontífice e a sociedade deveriam ser no século XIX, assim como era.

O artigo sobre Gregório VII inicia relatando as histórias que, para o jornal, são inventadas sobre o pontífice, inclusive o chamando de promotor da Inquisição.

Os modernos chrystões assim como crearam uma religião segundo seus desejos, desprezando a religião positiva, tambem crearam uma historia fantastica, onde pretendem encontrar cumplices, inventando mentirosas calumnias sobre os representantes mais conspicuos do catholicismo.

O grande Papa Gregorio VII não escapou ás iras de nossos implacaveis adversarios, e até o fizeram promotor da Inquisição, quando esse tribunal foi instituido um seculo depois da morte daquelle insigne Pontifice. (“São Gregório VII” 1)10

Gregório VII é apresentado desde seu nascimento até a eleição papal, enfatizando-se o fato deste ter aguardado por dois meses para ser consagrado, pois quis esperar o consentimento do imperador Henrique IV. O artigo registra que foi o último papa a ter tal atitude, e podemos entender a inclusão dessa informação como um apontamento para as ações futuras do pontífice em relação ao monarca, dando o tom de que Gregório reage aos insultos do imperador e não sendo o vilão, como alguns assim o colocaram no conflito. As reformas feitas pelo papa são louvadas.

O novo Papa, do zelo intrepido, robusta inteligência, vasta erudição e ornado das virtudes christãs, procurou reformar os costumes na Igreja, e principalmente abolir a simonia, vicio enraizado em muitas partes do mundo catholico naqueles tempos e vergonhosamente favorecido pela cobiça dos imperadores, que constumavam instituir os Prelados. (“São Gregório VII” 1)

Mesmo que se admita uma atitude reprovável da Igreja no período, como a simonia, a conta da culpa é colocada nos imperadores, que tinham o direito de indicar os prelados. Deste modo, a publicação do Dictatus Papae não somente seria justificável, mas também necessária, uma vez que a intervenção do poder temporal sobre a esfera espiritual estaria provocando vergonha à Igreja. As atitudes de Gregório VII são válidas, uma vez que ele é a base para toda a construção social, bem como mediador e mantenedor da paz. “O direito publico então vigente fazia do pontificado catholico a chave do edificio social, e ao Papa competia dirimir as questões controversas entre príncipes e subditos, como o pai commun da christandade, e portanto interessado no bem de todos”. (“São Gregório VII” 1)

Sendo o pontífice a pedra fundamental que sustenta toda a construção social, tem ele por direito, não somente religioso, mas político, a gerência do poder temporal. Nesse sentido, “serviu-se Gregório VII da jurisprudencia admitida na idade media”. Assim, a reação negativa de Henrique IV deve-se à sua “ambição e orgulho” que “não conheciam limites”. O artigo do jornal passa então à narrativa dos fatos apresentando o imperador como um homem de “má conducta, injustiças e desprezo á Religião”, já o papa, foi aquele que injustamente morreu no exílio. Gregório VII “morreu santamente em 1085, consolando-se em seus sofrimentos pela pureza de suas intenções, rectidão de seu zelo, dirigindo aos assistentes estas palavras: [...] morro no exilio, porque amei a justiça, e não tolerei a iniquidade”. (“São Gregório VII” 1)

Gregório VII deveria ser lembrado pelos seus “brilhantes dotes”, um “amigo da justiça, fidalgo adversario da iniquidade”, diferente dos insultos que o imputavam. Ao papa não poderia prevalecer a séria acusação de ter este deposto um rei. Contudo, o artigo do jornal apresenta uma questão: Não teria sido um ato de abuso a autoridade papal depor um rei?

Nossa resposta é negativa, porquanto o direito publico vigente na idade media considerava o Papa supremo [palavra ilegível] nestas questões, e conseguintemente o seu acto foi o exercicio de um direito consagrado na constituição politica dos povos daquella época, direito inspirado no respeito para com o chefe supremo do catholicismo, util naquella sociedade, onde tão violentas paixões reinavam, sendo apenas moderadas pela religião. (“São Gregório VII” 1)

A sociedade medieval deu esse direito ao papa, pois reconheceu que ele era o único capaz de manter a coesão social. O artigo aponta que o direito político dado ao pontífice não era fruto da constituição da Igreja, mas admitido pelos medievais, que entenderam a importância do papel que o apóstolo de Cristo desempenhava.

A sociedade da idade media, sociedade profundamente christã, commetteu algum delicto, porque devolveu ao chefe do catholicismo então reconhecido officialmente o supremo poder de dirimir as grandes questões, que dividiam os povos, evitando dest’arte muito sangue derramado por meio da auctoridade desse grande pontificador? (“São Gregório VII” 1)

O papa não era somente a ponte que levava o homem ao divino, mas aquela que mantinha as boas relações sociais. E a sociedade da Idade Média reconheceu isso. Contudo, os “governos hodiernos” buscaram sozinhos manter a paz e evitar as guerras, mas fracassaram, “produziram sangrentas guerras, e ameaçaram o mundo actual de total ruina”. O que se pode concluir, segundo o artigo do jornal, é que “não bastam congressos politicos, não bastam interesses para frear as paixões humanas, reter as ambições, e o desejo de conquistas”. Seria necessário que os governos se estabelecessem sobre “as bases da justiça, da honestidade, da honra, da lealdade, da dignidade”. A questão é “quem dará taes principios a sociedade?”. Não seria nenhuma outra religião, nem mesmo o protestantismo ou o racionalismo. “O que resta? O catholicismo, cuja organização tem resistido a todas as provações, inoculando no coração dos povos o respeito á auctoridade legitima, o decoro, a honra”. (“São Gregório VII” 1)

Não há como negar a autoridade e centralidade do catolicismo e do papa. Negá-los seria rejeitar princípios fundamentais para a construção social. “Si é certo que no catholicismo está o centro de toda a bôa organisação social, será por ventura um mal que a sociedade cerque de honra, prestigio, respeito o nosso supremo Pastor?” (“São Gregório VII” 1). O catolicismo é a única fonte de tais princípios e o papa é o único capacitado a administrá-los na sociedade. A Idade Média reconheceu isso e fez o papa o centro de sua formação, e a modernidade deveria fazer o mesmo.

Inspirada em taes princípios deu a idade media amplos poderes ao chefe da christandade, cercou-o de veneração, e considerou-o como a maior auctoridade, que existe sobre a terra, porque é de feito Vigario de Jesus Christo o representante de Deus, o mais augusto personagem por causa dos immensos privilegios, com que ornou-o o nosso Deus. (“São Gregório VII” 1)

Dom Macedo, dois anos depois desta publicação sobre Gregório VII, no contexto de sua prisão, se apropria da imagem do papa e assemelha-se a ele. Em uma carta pastoral de 1874, o bispo escreve a respeito de sua condenação e, assim como o pontífice no século XI, Dom Macedo se vê injustiçado, construindo uma narrativa muito parecida com a que apresentara o jornal A Boa Nova em 1872. Ele afirma ter dedicado sua vida à Igreja, sem ter cometido crime algum. O bispo abre a pastoral dizendo:

Irmãos e Filhos dilectissimos! Depois de treze annos de laborioso episcopado, treze annos de visitas pastoraes, de prédicas, de exhortações continuas e fervorosas, de Sacramentos administrados com amor, de orações, de trabalhos, de lutas, de sacrifícios e incessante solicitude pelo vosso bem, pela salvação de vossas almas, vistes de repente com dolorosa supreza, ó caros Filhos, o vosso Pastor, o vossa Pai em Jesus Christo, de cujo labios nunca ouvistes senão palavras de paz, de obediência e respeito ás leis divinas e humanas, accusado e pronunciado pelas justiças do nosso paiz como autor de nefanda conspiração contra a soberania nacional e as leis do Estado, e como tal preso em sua residencia, levado publicamente pelas ruas, e encarcerado n’uma praça militar, no meio da consternação e das lagrimas do povo fiel e, pouco depois, arrancado o seu querido rebanho, arrastado á barra de um tribunal incompetente, e codemnado, enfim, a quatro anos de prisão com trabalhos forçados! (Costa, “Carta Pastoral” 3-4)

O episódio que leva à prisão do bispo é apresentado aqui envolvendo muita comoção. Um governo injusto que humilha publicamente um servo de Deus e leva o seu povo ao sofrimento. O bispo poderia ter buscado referências bíblicas, até mesmo no próprio Filho de Deus no contexto da Paixão, mas não. Para Dom Macedo, seu sofrimento é comparado ao sofrimento do papa Gregório VII. “Accusado, como nós, de inimigos das potencias da terra, atacado pela côrte da Allemanha, e perseguido de todos os lados o inclyto e immortal Pontifice S. Gregorio VII, que morreu no desterro pela causa gloriosa da liberdade da Egreja” (Costa, “Carta Pastoral” 6). Assim como o pontífice, o bispo estaria sofrendo, mas não por algum erro que tenha cometido. “Porque estes trabalhos que soffremos não resultam de crime que hajamos commetido, senão da nossa fidelidade em sustentar os dogmas e leis da Santa Egreja, conforme o estricto dever de nosso cargo pastoral” (Costa, “Carta Pastoral” 7).

Dom Macedo segue sua argumentação evocando alguns trechos de uma carta que o pontífice Gregório VII teria enviado ao rei Afonso VI de Castela. Nos trechos destacados, o bispo busca demonstrar nas palavras do papa as calúnias que sofrera o pontífice, enquanto que suas ações sempre foram em prol da Igreja, como expresso nesta parte: “procura-se a causa dos odios e calumnias de que sou objecto, achar-se-ha que procedem, não dos pecados que posso ter commettido, senão pelo contrario do zelo com que tenho sempre, sustentado a virtude e combatido a injustiça”. O bispo reconhecce sua posição hierárquica abaixo do papa, mas isso não o impede de se vê nele.

Salva a incommensuravel distancia que medeia entre as preclaras virtudes e gigantescas obras apostolicas daquelle egregio e piedossisimo varão e as nossas, podemos dizer, como elle, que de termos levantado a voz e defendido, sem respeitos humanos, nosso rebanho, contra os lobos que o invadiram, de termos sahido a campo e tomado medidas convenientes para manter na nossa diocese a pureza da fé e do culto catholico, em conformidade com os grandes Canones, com as determinações do Summo Pontifice, o espirito da Egreja Universal, nos proveio esta cruel tribulação. (Costa, “Carta Pastoral” 8)

A narrativa construída pelo bispo nos permite dizer que ele se apropria da história da Igreja e do cristianismo a fim de dar base a sua argumentação. Vale ressaltar que, para Dom Macedo, Igreja e o cristianismo são a uma só coisa. Ele afirma: “a Egreja é o Christianismo; o Christianismo é a Egreja” (Costa, “Carta Pastoral” 26). Não há diferentes formas de entendimento acerca de nenhuma dessas esferas, o que há de diferente destas, não passam de heresias. É uma concepção de história uniforme e harmônica. “A origem, a essencia, a propagação, o desenvolvimento, a historia, a duração e a vida do Christianismo, é a origem, a essencia, a propagação, o desenvolvimento, a historia, a duração e a vida Egreja” (Costa, “Carta Pastoral” 28). Uma história que resulta na Igreja Católica Apostólica Romana. O bispo se apropria da teologia e doutrina medievais para validar a defesa de seu projeto e de suas ações. Tal como o papa Gregório VII, o bispo, que sofre as mesmas injustiças, assim procura no medievo a solução para o seu presente, entendendo-o como um período a ser exaltado.

Na defesa de Dom Macedo, a Idade Média é apresentada como um tempo de luz que reluz por meio da vida de seus santos doutores. No que diz respeito à infalibilidade do papa, o bispo se apropria das defesas propagadas pelos santos doutores medievais. “E que direi das luzes da edade media, de S. Anselmo, S. Bernardo, Alberto, S. Tomaz de Aquino, Boaventura e outros? Todos elles, que na edade media brilham como estrellas no ceu da sciencia ecclesiastica, são defensores da infalibilidade papal” (Costa, “O Papa e sua Infalibilidade Doutrinal” 3). Entretanto, para alguns outros, o poder papal teria limites bem estabelecidos, sendo chamado até mesmo de usurpação. “Lembrar-se-hão nossos leitores que o Boletim do Grande Oriente Unido sustentou o dominio temporal dos Papas na idade media foi uma usurpação, uma tyrania, uma contradição ao Evangelho” (“A Maçonaria Julgada Pelo Sr. José d’Alencar” 3). Outros ainda afirmam que a infalibilidade papal é uma doutrina posterior ao século XV e XVI, contudo “esta doutrina não data destes tempos, conhecida de todos os séculos anteriores, epoca de que fallamos [Idade Média]”. A época moderna teria forçado com que tal doutrina fosse “apenas affirmada com mais energia, e ensinada mais in extenso, porque alguns tinham ousado pol-a em duvida, e contraria a tradição da Santa Igreja” (Costa, “O Papa e sua Infalibilidade Doutrinal” 3). Esta época trouxe o movimento de grande oposição à Igreja, fazendo de tudo para tentar derrubá-la.

Foi só no século decimo quarto, que alguns principiaram a combater a antiga doutrina, os humores impuros reuniram-se para formar, se assim se pode dizer, uma grande pustula, que arrebentou na religião que se condecora com o nome de ‘reforma’. Bem alto levantaram-se então as vagas, bem terríveis eram as tempestades que o demônio então largou contra a pedra de S. Pedro – impotentes quebraram-se neste rochedo, não o poderão derrubar. (Costa, “O Papa e sua Infalibilidade Doutrinal” 3)

Desde então, muitas são as aflições que intentam contra a vida do Santo Padre e sua autoridade sobre os povos católicos do mundo todo. Todavia, para Dom Macedo o papa é o “Chefe Augusto da Igreja Universal, digno successor de S. Pedro e Vigario de Jesus Christo sobre a terra” (Costa, “Governo do Bispado” 1). Em uma comunicação direta entre o bispo e o papa Pio IX por meio de cartas, o pontífice engradece o empenho e a ajuda de seu episcopado em meio a tantas adversidades, agradecendo pelo “alívio que vós, Vuneravel Irmão, juncto em vosso Clero dar a nossa tristeza” (Pio IX 1). O bispo do Pará comunga da defesa da autoridade papal construída ainda no medievo.

O jornal A Boa Nova, ao tratar do poder espiritual e temporal dos papas, se apropria da Idade Média, dos doutores medievais e da história política carolíngia, para defender a supremacia papal. A soberania espiritual dos papas, mesmo que divina, não exclui os meios terrenos, isto é, temporais. O reino da Igreja não é deste mundo, como afirmou o Messias, entretanto ele existe em meio a este mundo, servindo-se assim do “emprego dos meios terrenos”. Assim, “o domínio temporal dos Papas é um d’estes meios”. Ao fazer tal afirmativa, evoca os doutores da Igreja, apontando que estes, mesmo que não tratem da questão temporal, falam da origem espiritual deste poder. Segundo “interpretes muito auctorisados, como S. João Chrysostomo e Santo Agostinho o Salvador, longe de declarar que o poder temporal lhe não pertence, só falla n’este logar da origem de seu poder real, que diz não haver do mundo, mas sim de seu Pae celeste” (Padre Schouppe 2). O papa não representa um perigo para os estados, o pontífice é infalível, teologia também defendida pelos santos doutores “Basílio, Gregorio, Ambrosio, Cypriano, Agostinho”, a infalibilidade do papa “sempre fez parte do dogma em toda a Igreja universal; e como tal foi ensinada, sempre foi seguida e sempre por todos confessada” (Costa, “O Papa e sua Infalibilidade Doutrinal 3). O Pará também comunga desta crença “eis ahi a doutrina da infalibilidade pontifícia ensinada por dois grandes luzeiros da Igreja brasileira, gloria e ornamento da Provincia do Pará”11. O ensino do bispo rompe com o tempo e faz com que a Igreja universal medieval se faça presente no Pará do século XIX.

Prosseguindo a respeito do poder temporal do papa, o exercício deste sobre um estado, “effectivamente o é desde o século VIII em virtude das doações de Pepino, de Carlos Magno, de Lothario, e mais tarde, da condessa Mathilde”. Este direito não está expresso na Bíblia e nem estava presente entre os primeiros cristãos nos primeiros séculos, uma vez que não era absolutamente necessário, “mas, desde o seculo VIII foi o meio escolhido pela Providencia para conservar livre e independente a auctoridade espiritual do Chefe do Catholicismo”. Foi no atrelamento da Igreja ao Império Romano que surge a necessidade de assegurar tal direito aos papas. “Quanto á intervenção dos Papas nos negócios temporaes dos principes na edade media” para melhor compreender, “importa ter em vista os tempos e as instituições; só assim se conhecerá que os Papas foram homens do seu seculo e que obraram como deviam obrar os chefes da sociedade n’esta epocha” (Padre Schouppe 2).

A união da Igreja com o Estado no medievo implicou na necessidade de protegê-la frente ao poder temporal ou ela poderia ficar submetida a ele. Nesse sentido, foi dada ao papa, não somente pela sua importância, mas também pela sua capacidade de conciliação, a supremacia.

A sociedade europea era toda catholica. Povos e reis conheciam o Papa por chefe espiritual, veneravam-no como seu pae, e a elle recorriam como ao juiz ou arbitro natural de suas questões. Esta arbitragem muitas vezes repetida, tornou-se pouco a pouco de direito publico: constituiu e favor dos Papas e pela vontade dos príncipes uma suzerania suprema no systema feudal. Accrescente-se a isto que os Canones dos Concílios, segundo os quaes o Papa pronunciava suas sentenças, tinham plena auctoridade na legislação civil. – O papa pela sua parte, considerava todos fieis, inclusos os reis, como os seus filhos muito amados. Os reis sobretudo, dos quaes depende o bem dos povos, eram os mais queridos objectos de sua sollicitude. Instruia-se e exhortava-os com benignidade. Se algum príncipe, desatendendo e menospresando suas advertencias, continuava a opprimir os povos ou a perturbar a Igreja por seus escando-los e por seus crimes, ameaçava o com firmesa e fulminava-o com a excommunhão.

Levantando de novo o imperio do Occidente, os Papas haviam estabelecido um imperio christão, submettido nas coisas temporaes a um chefe electivo. A eleição fazia-se em virtude d’uma constituição que o eleito jurava observar, e que o privava de seus direitos se faltava juramento. Quando elle era accusado de haver infringido esse juramento, quem devia decidir este ponto importante? Era o Papa necessariamente: elle pronunciava; e era neste sentido que desligava os povos do juramento de fidelidade (Padre Schouppe 2).

O papa era o cimento social que mantinha a sociedade de pé. A “auctoridade dos Papas era um freio que conservava os soberanos na observancia de seus deveres, e uma protecção dada á vida e liberdade dos poucos”. Contudo, a centralidade, o direito e a importância do papa não diziam respeito somente aos tempos passados. “Os Papas da edade media eram o que os Papas de todos os tempos e o que elle são ainda hoje; os defensores da verdadeira auctoridade contra todas as licenças, os conciliadores da paz em todas as guerras e discordias” (Padre Schouppe 2). Não há dúvidas para a diocese do Pará, dirigida por Dom Macedo, que era necessário não somente conservar, mas retomar as bases da autoridade papal medieval. Mesmo que em conflitos diferentes, a ação deveria ser a mesma do período de maior estabilidade e domínio da cristandade. Não somente se recorre a auctoritas, mas também apresenta o caráter de multitemporalidade, aplicando no presente, preceitos do passado e pensando o papa como atemporal, afirmando que o papa da Idade Média é o de todos os tempos, inclusive o de hoje.

A Idade Média está longe de ser uma época de trevas, no sentido de paralisia do conhecimento e progresso. O catolicismo, ao contrário das acusações, “não apagou as legitimas liberdades, não destruiu a razão, mas dirigiu-a, esclareceu-a, iluminou-a”, e a Idade Média foi a responsável por preservá-las e fazê-las florescerem, como já pontuamos aqui. Dom Macedo se encarrega de escrever uma carta pastoral e publicá-la no jornal A Boa Nova em 20 de março de 1872. A Carta é uma resposta à publicação intitulada Protesto do partido liberal, que apresenta uma série de questões contra a atitude do bispo do Pará e do movimento ultramontano, como a problemática das intervenções leigas em assuntos eclesiásticos. O Bispo do Pará escreve a pastoral a fim de contra-argumentar sobre o que ele considera como os falsos princípios liberais e as blasfêmias contra a Igreja, defendida por ele como “Catholicismo Romano”. Nesse sentido, ao sustentar que existe uma verdadeira religião, reafirma suas convicções em detrimento de outros projetos teológicos doutrinários de Igreja no período.

Sua resposta e combate são baseados nas palavras de Santo Agostinho, que orientam os bispos a não se calarem diante das impiedades, mentiras e blasfêmias contra a Igreja.

Nós, Bispos catholicos, posto pelo Espirito Santo para reger a Igreja de Deus, o que devemos fazer? Calar-nos?

Não, isso não é possível. Não podemos guardar silencio, quando o êrro ahi está fallando alto e de cabeça levantada. Como! Exclamava Santo Agostinho em semelhantes circumstancias, em presença d’este diluvio de êrros, de mentiras e de sophismas, vem-se-nos dizer: calae-vos? An verò illi faciunt et mihi dicitur: Tace?

‘Aperte de mim o Senhor tamanha falta de siso, continua o Santo Doutor, que ordenando-me Elle pelo seu Apostolo, e declarando-me dever o Bispo contradizer aos que ensinam o êrro, eu me recolha ao silencio, com mêdo das despresiveis iras e declamações do inimigo da verdade. Pois o Senhor, como eu o provo pela Evangelho e pelas Cartas Apostolicas, ordena que fallemos, que annunciemos a doutrina, que refutemos os pregadores de doutrina contraria, que insistamos opportuna e importunamente, nenhum homem neste mundo me persuadirá jamais dever eu calar-me sobre as enormidades de que estamos sendo testemunhas. Se minha palavra suscita tempestades e criminosas violencias, não faltará o Senhor para defender a sua Igreja, Elle que sujeitou ao jugo d’ella todos os reinos terrestres espalhados pela superficie do universo’. Até aqui egregiamente o grande doutor Santo Agostinho. (Costa, “Carta Pastoral” 1)

Dom Macedo se apropria das palavras do doutor da Igreja, uma vez que acredita viver em circunstâncias semelhantes ao do Santo. Dessa forma, assim como aquela época foi de vitória, ele esperava sê-lo. O bispo do Pará enumera dez erros que deseja refutar com a pastoral. Ele aponta como segundo erro a acusação de que os bispos estariam ultrapassando suas atribuições ao condenarem outras doutrinas, sendo imputado somente a estes o limite de discuti-las e não barrarem a liberdade de pensamento. Por meio do protesto, o partido liberal estaria alegando que os bispos não possuíam autoridade para determinarem medidas a respeito de outras doutrinas e ideias que não fossem as suas. Contudo, para Dom Macedo, tal afirmação seria simplesmente dizer que “o Bispo não tem auctoridade para ensinar obrigatoriamente as verdades da Religião”. (Costa, “Carta Pastoral” 1)

Enquanto que, para Dom Macedo, a atitude do partido liberal era um ataque ao princípio de autoridade do clero; para o protesto publicado, a atitude dos bispos em coibir seus fiéis a negarem outras doutrinas era um abuso de autoridade, como se havia vivenciado na época de obscurantismo da Igreja, a Idade Média. Afirma o protesto publicado pelos liberais,

foi um attentado escandaloso contra os direitos da Razão absoluta, do livre pensamento, da imprensa livre, e este acto de auctoridade, renovando as scenas da idade media, querendo fazer retroceder o mundo para as epochas do obscurantismo, em que sob a influencia clerical o pensamento era abafado nas torturas dos carceres, ou nos scintilantes clarões das fogueiras, nenhum effeito absolutamente pode ter em plena civilisação do século 19º e neste torrão predilecto da liberdade. O nosso povo felizmente bastante adiantado em civilisação, ri-se das bravatas dos Bossuets caricatos. E com effeito um acto de auctoridade episcopal condenando doutrinas neste século! É porem todas as mãos nas ilhargas e morrerem de riso! (Costa, “Carta Pastoral” 2)

Destacamos que os liberais reconhecem as atitudes do bispo do Pará em seu espipocado como medievais. Mesmo que na visão apresentada por eles, o período representaria o abuso de autoridade da Igreja e uma época que deveria ser superada, ressalta-se o conhecimento acerca do período como uma ideia viva no século XIX, no Pará. Não somente uma ideia viva, mas um projeto em prática. O que, para o partido liberal, entre os quais se encontravam também clérigos com uma visão de catolicismo diferente de Dom Macedo, o medievo era uma época a ser superada; para o bispo do Pará, era uma referência viva colocada em prática.

O debate apresentado pelos periódicos deixa claro que a Idade Média, mesmo que não tenha sido uma experiência histórica do Brasil, é um conceito vivo na experiência de construção de Igreja no século XIX, no Pará. Entendendo-a seja como um retrocesso ou mesmo como base para a formação religiosa, político e social, o que importa-nos aqui é que a Idade Média não somente existiu como história europeia, mas tornou-se o que podemos chamar de “entidade viva”, que poderia se instalar nesta região pelas ações de Dom Macedo, ou mesmo dos ultramontanos ao longo do país. O riso e o desdém dos liberais, condenando o atentado dos bispos à liberdade, não escondem o medo da possibilidade de retorno a tais tempos de obscurantismo, o que significa a força das ideias do bispo na região. Caso as atitudes do bispo não tivessem um impacto significativo, não justificaria a publicação não só deste artigo, mas de muitos outros ao longo da década de 1870. Entretanto, no projeto de Dom Macedo, o medievo é a referência para seu proceder. O bispo então responde ao Liberal:

Ainda uma vez, caríssimos Irmãos e Filhos, não é negar claramente que a Igreja de Jesus Christo tenha auctoridade para intimar uma doutrina ás conciencias em nome de Deus? Não ouvis o que estes homens dizem, ser uma cousa ridícula dizer um Bispo dizer ao seu povo: evitae taes leituras; não deis consentimento a taes doutrinas: são impiedades, são heresias? Não ouvis o que estes homens dizem que ninguem neste seculo deve fazer caso do que ordenam os augustos chefes da Religião, antes deve-se-lhes responder com estrepitosas gargalhadas? (Costa, “Carta Pastoral” 2)

A Igreja tem autoridade de se colocar contra o que julgar contrário à sua doutrina, a atitude dos liberais é “a negação aberta da auctoridade, da auctoridade mais santa, mais augusta, mais respeitável que ha sobre a terra!”. A defesa de um pensamento livre esconde a negação à Igreja. “Pensamento livre! Eis a grande palavra da impiedade moderna. Livre de que? Livre de toda Religião positiva e revelada, livre de acreditar nos mysterios ensinados por Deus; livre de sacudir o jugo dos preceitos por Elle promulgados!”. Um pensamento livre “é a fórmula adequada do racionalismo, do naturalismo o mais brutal” (Costa, “Carta Pastoral” 2). A liberdade de pensamento é chamada pelo bispo de paganismo:

é o pecado de infidelidade que S. Thomaz de Aquino diz resumir em si todos os outros, o pecado que separa formalmente o homem de Deus, pois que conserva o homem afastado do verdadeiro conhecimento de Deus, o peccado em fim cuja perversidade excede a maior perversidade moral. (Costa, “Carta Pastoral” 2)

A teologia e a doutrina medieval foram instrumentalizadas por Dom Macedo no Pará do século XIX. Os jornais dirigidos pelo bispo e ainda muitos outros escritos poderiam ser explorados para dar conta de tantas outras doutrinas medievais que são acessadas pelo bispo para colocar em prática seu projeto teológico de Igreja medievalizante.

A Idade Média oferece ao bispo os modelos de Igreja, sociedade, família, moral, ensino, combate às heresias, autoridade espiritual, infalibilidade papal, perfeitos. Uma sociedade profundamente cristã, para usar uma das expressões do bispo, que soube edificar-se quando escolheu manter a Igreja no centro de toda a sua construção. O período medieval, tido por alguns de seus contemporâneos como tempos obscuros, é defendido pelo bispo e exaltado. Dom Macedo busca na história da Igreja Medieval os elementos que conferem legitimidade à sua argumentação. A Idade Média é apropriada com o objetivo de dar sentido à visão de mundo em que vive, bem como um meio de criticá-lo. Nesse sentido, afirmamos que o projeto teológico doutrinário de Dom Macedo é medievalizante, porque ele transporta para o século XIX uma ideia de medievo a fim de recuperar um domínio católico em diluição.

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1. É doutora em História pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ e Professora Substituta da mesma instituição, Campus Seropédica, condição de produção deste artigo. Email: yaraipb@hotmail.com. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8265357953208153

2. Nesse aspecto, os autores se apropriam do entendimento de Alain Boureau a respeito do cristianismo como uma religião mais baseada em sua narrativa do que em seus preceitos. Essa narrativa é feita na história, mesmo que envolvam diferentes temporalidades.

3. Ressalta-se que foi utilizado a ideia de função, apontando para outras possibilidades de uso das imagens e relíquias. Os objetos, a liturgia, o lugar desempenham diferentes funções no contexto de uso cristão e religioso.

4. Gênesis 1.26 “Deus disse: Façamos o homem à nossa imagem, como nossa semelhança”.

5. Ressalta-se que foi utilizado a ideia de função, apontando para outras possibilidades de uso das imagens e relíquias. Os objetos, a liturgia, o lugar desempenham diferentes funções no contexto de uso cristão e religioso. Os jornais diocesanos do Pará A Estrella do Norte (1861-1869) e A Boa Nova (1871-1883) estão disponíveis digitalizados na Hemeroteca digital da Biblioteca Nacional Digital do Brasil que em parceria com a Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves apresenta um rico acervo de diferentes periódicos do país da época imperial e republicana, alguns deles citados neste artigo. Deixaremos o link para acesso dos dois jornais dirigidos por Dom Macedo: A Estrella do Norte, disponível em: https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=223859&Pesq=obedecerei&pagfis=1 A Boa Nova, disponível em: https://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=800341&pesq&pagfis=1 Acesso em 10 de julho de 2021.

6. Ressalta-se que foi utilizado a ideia de função, apontando para outras possibilidades de uso das imagens e relíquias. Os objetos, a liturgia, o lugar desempenham diferentes funções no contexto de uso cristão e religioso. O uso do termo brasileiro foi empregado dentro de uma perspectiva mais de nomenclatura espacial do que com sentido de Nação ainda em processo de fabricação.

7. Ressalta-se que foi utilizado a ideia de função, apontando para outras possibilidades de uso das imagens e relíquias. Os objetos, a liturgia, o lugar desempenham diferentes funções no contexto de uso cristão e religioso. O tema do ultramontanismo foi abordado e aprofundado na pesquisa de doutoramento, bem como a reforma física e imagética da Catedral. Cf. SANTOS, Mayara Fernanda Silva dos. Para além de Roma, à Idade Média: o projeto reformador teológico-doutrinário e iconográfico do bispo Dom Antônio de Macedo Costa no Pará (1861-1890) analisado por intermédio do neomedievalismo. Tese (Doutorado em História). Instituto de Ciências Humanas e Sociais, Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica, RJ, 2022.

8. Ressalta-se que foi utilizado a ideia de função, apontando para outras possibilidades de uso das imagens e relíquias. Os objetos, a liturgia, o lugar desempenham diferentes funções no contexto de uso cristão e religioso. O jornal O Romano também está disponível em algumas edições na Hemeroteca digital da Biblioteca Nacional Digital do Brasil. Link para acesso do jornal O Romano na hemeroteca digital: https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=814300&pagfis=1 Acesso em 10 de agosto de 2021.

9. Ressalta-se que foi utilizado a ideia de função, apontando para outras possibilidades de uso das imagens e relíquias. Os objetos, a liturgia, o lugar desempenham diferentes funções no contexto de uso cristão e religioso. Em sua tese, Leandro Duarte Rust apresenta um debate historiográfico e conceitual sobre a ideia de Reforma Gregoriana a fim de romper com a ideia uniforme e de um movimento estritamente eclesiástico. Cf. Ibidem.

10. São Gregório VII. A Boa Nova. Belém, 03 de janeiro de 1872, ano II, nº 1, p. 1. As citações a seguir são do mesmo artigo.

11. A QUESTÃO actual julgada segundo a doutrina de dois Bispos, filhos desta Provinvia. A Boa Nova. Belém, 03 de janeiro de 1872, ano II, nº 2, p. 3. Os bispos a que o artigo faz referência é Dom Romualdo de Souza Coelho, bispo do Pará antes de Dom Antônio de Macedo Costa e o bispo Dom Romualdo Antônio de Seixas, arcebispo da Bahia, ambos nascidos na Província do Pará. Os dois bispos são considerados luzeiros pelo artigo do jornal e seus ensinos compartilhados até aquele momento. O que se ressalta é que Dom Macedo comungava da mesma defesa, como expresso no final do artigo. “Vê-se que a doutrina ensinada hoje pelo nosso digno Pastor é a mesma ensinada por D. Romualdo de Souza Coelho e D. Romualdo Antonio Seixas, Arcebispo da Bahia”